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Published: October 23rd 2012
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Sarlat-la-Canéda
O 'badaud' - Place de la Liberté Ingredientes: - 500 g de pedras calcárias;
- 1 L de água do médio vale do rio Dordogne;
- Uma dúzia de séculos de história;
- Uma tigela de romanos e gauleses, bem misturados;
- Bispos e abades a gosto, para temperar.
Modo de preparo: Em uma panela funda, adicione a água e as pedras e aguarde a fervura. Adicione, então, os romanos e gauleses, mexendo energicamente para propiciar boa mistura. Abaixe o fogo e acrescente os bispos e abades. Tape a panela e deixe cozinhar ao longo de séculos de história. Enquanto aguarda ficar pronto, relaxe e leia esse blog que, à exceção do título e dessa pequena introdução, não tem muito mais de gastronômico.
Sarlat: um ensopado périgordin
Brasileiros costumam desenvolver, com a escola, uma relação bastante curiosa com os dias de feriado. Afinal, o que importa, quase sempre, não é o motivo do dia especial, mas sim a sua posição na semana. Feriados que caem aos sábados e domingos são vistos como desperdiçados, e sequer mereceriam constar no calendário daquele ano; se caem as quartas são bons, uma pausa no meio da semana; na segunda e
sexta são ótimos por garantir os ditos finais de semana de três dias – afinal, nada como ter duas sextas-feiras ou chegar na tarde de domingo sem aquela sensação modorrenta de estar prestes a voltar para a rotina. Mas nada se compara às terças e quintas-feiras, e a incrível alegria de “enforcar” um dia. Eu, como bom estudante brasileiro, tinha a regra do enforcamento como verdade universal.
Voltemos, então, ao intercâmbio. Descobrira que dia 11/11 é um importante feriado francês (dia do Armistício da 1ª Guerra Mundial, para os desavisados) e – alegria, alegria – naquele ano cairia bem numa quinta-feira! Feriadão, comemorei. O Daniel estava de férias em Bordeaux até o sábado, então com isso teríamos dois dias para uma pequena viagem. Mal fizéramos os planos – a ideia era conhecer a região da fronteira França/Espanha (Hendaye e San Sebastián) - levei um balde de água fria (e não falo aqui da chuva que caía sem trégua desde o começo do mês): descobri que não haveria enforcamento e, para melhorar, teria um compromisso importante do estágio na sexta-feira! Sem escapatórias, e sem viagem :
Em todo o caso, eu continuava tendo uma visita em casa, e nós
Fachadas da cidade
A la ville de Sarlat continuávamos tendo um dia de feriado. Ao contrário do dia anterior (ver
La Rochelle: um porto seguro em meio às tormentas), a previsão era de chuva para todos os lados. Sem ter para onde fugir, resolvemos, então, seguir com o plano original: ir para a fronteira franco-espanhola.
Daniel: Bom, obviamente só porque falamos que íamos pra Espanha, não fomos. Acordamos às 6h30 da manhã (o Luis, claro; eu acordei 6h50) tendo ido dormir às 3h pra podermos pegar o trem de 08h25 para Hendaye. Tomamos o café, arrumamos tudo e saímos na hora certa pra chegar e ter tempo de comprar o ticket e pegar o trem. Só faltou um detalhe: era feriado nacional na França. Resultado: o tramway passaria só em 18 minutos, suficiente para não chegarmos a tempo… Andamos 2 estações de tram pra frente para ir ao ponto de ônibus mais próximo, só para chegar lá e ver os ônibus saindo… Próximo ônibus em 20 minutos… Chegamos na estação algo próximo de 08h33 e o trem, claro, já tinha saído, na hora.
Luis: Nessa hora foi preciso acionar o nosso grande plano B: como já havíamos saído cedo de casa e estávamos ali na gare, para algum lugar nós iríamos. Analisamos
as próximas partidas e, um pouco mais tarde, lá estávamos nós num trem rumo à Sarlat.
« Sarlat-la-Canéda, la capitale du Périgord noir et du foie gras ! On tombe immédiatement sous le charme de cette cité médiévale. Les hautes maisons fleuries, les petites ruelles, la pierre omniprésente forment un décor historique de qualité. »
Sarlat (ou Sarlat-la-Canéda), apesar de ter uma população inferior a dez mil habitantes, é uma das principais cidades do departamento da Dordogne, capital da região conhecida como ‘Périgord Noir’ (o Périgord Negro). Seu grande atrativo é o seu centro histórico, que com suas ruelas sinuosas e arquitetura preservada parece ter parado no tempo com o final da Idade Média – e não por acaso é frequentemente empregado como cenário para ‘filmes de época’, como por exemplo “Os Miseráveis” e “Joana D’Arc”).
A viagem de trem é longa, pela distância (são 170 km a partir de Bordeaux), e dura cerca de 2h30 a 3h. Naquele dia, como não parava de chover, isso não era problema, pois ao menos assim nós ‘passeávamos’ a seco. Além do mais, na medida em que o trem avançava pelo Dordogne, a paisagem ficava mais interessante, com colinas
Chegada à Sarlat
Cidade-fantasma? que viravam morros (“morrinhos”, como diz o Daniel – também, não dá para querer comparar com os Alpes de Nice) e iam pouco a pouco delimitando o vale do rio. Após Bergerac, a ferrovia segue quase paralela ao curso do rio, permitindo vislumbrar entre bosques e pastagens inúmeros châteaux e cidadelas que se fundiam harmoniosamente com o entorno. Apesar disso, o sono da noite mal dormida e o balanço do trem eram irresistíveis, então a paisagem era interrompida aqui e ali por umas longas cochiladas. Foi assim, sem perceber o tempo passar, que chegamos à Sarlat.
A primeira vista, parecia uma cidade fantasma: não havia ninguém na plataforma, os guichês e lojas da estação estavam fechados, e os poucos passageiros que ali desembarcaram conosco logo desapareceram. Por sorte havia uma prateleira com panfletos turísticos, onde conseguimos um mapa da cidade e uma sugestão de roteiro pelo centro, para observar os pontos mais importantes.
A estação de trem fica na encosta de um morro, a pouco mais de 1 km do centro. Antes do passeio, no entanto, a prioridade era comer, mas quanto mais avançávamos mais aumentava nossa impressão de cidade-fantasma: as ruas vazias, o comércio fechado. Chovia, e
nós ali famintos... Ok, era feriado, e estamos falando do interior da França. Mas logo descobrimos que havia um motivo maior: estávamos em pleno Festival de Cinema Histórico de Sarlat. Pela fila às portas do cinema, a cidade toda devia estar ali!
Daniel: A cidade em si é a principal da região, mas é bem pequena. Ela tem uma área em volta, que não olhamos. Fomos direto para o meio, ou o que eles chamam de "centro medieval". De fato, o centro é medieval. As ruas são todas curtinhas, com exceção da rua principal que corta a cidade, em que consegue passar 1 carro e tem 2 calçadas… o resto é tudo menor. Como toda boa cidade com legados medievais, possui sua catedral no meio, o hôtel de ville logo do lado e mais alguns prédios religiosos (outra igreja, cemitério...).
Como chegamos por volta das 14 horas e tínhamos tomado café às 7h, estávamos morrendo de fome. Mas aí que está o truque: os restaurantes param de servir 14h. E a saga pra encontrar um salvador que servisse comida por menos de 30€ a essa hora?? Fast-food não preciso nem dizer que não tinha né? Nem o
Rillettes d'oie
Entrada do menu do Daniel Kebab pé sujo (que, aliás, já dominou a França faz tempo). Por fim, encontramos um restaurante que tinha um
menu por 11.90€ (no meu caso) e 14.90€ (no caso do Luis). A diferença vocês vão saber em breve.
Menu aqui na França significa Entrada + Prato Principal + Sobremesa. No caso do meu, baratinho, a entrada foi
Rillettes d'Oie (oie é ganso, rillettes faço nem ideia) com pepino em conserva e saladinha de alface com tomate. A entrada do Luis tinha
foie gras, uma geleia que não descobrimos o que era e pão. Aliás, antes que eu me esqueça,
foie gras está para a região de Sarlat como vinho está para Bordeaux. Eles vivem disso. O meu prato principal foi
Faux Filet (melhor tradução que eu consigo pensar é contrafilé, mas estava bem macio) com fritas e outra saladinha, dessa vez com uma planta diferente e horrível. O prato principal do Luis foi um pato com sei lá o que tinha naquela gororoba. Segundo ele estava bom, e eu vou ter que acreditar. Como sobremesa, eu comi sorvete de baunilha e café e o Luis comeu torta alemã. Para acompanhar tudo isso, a velha
carafe d'eau (água da bica,
de graça, claro).
Saindo do restaurante (entupidos, diga-se de passagem), seguimos o tour do Office de Tourisme pra conhecer a cidade toda (que, pra falar a verdade, não demora muito mais de 2 horas). O interessante de Sarlat é que ela é uma mistureba de estilos arquitetônicos. Algumas coisas foram construídas no século IX, depois destruídas e revitalizadas no século XIV, aí destruídas de novo e reconstruídas no século XVIII. A catedral mesmo possuía uma base românica, o meio neoclássico e o topo gótico. As pinturas dentro dela? Barrocas.
Luis: Rodamos pela cidade até anoitecer (o que acontece por volta das 17h30, a essa altura do ano – saudades do horário de verão!), buscando apreciar cada detalhe do que o panfleto nos propunha, antes que ele se decompusesse em nossas mãos devido à chuva insistente. No geral, não dá para se dizer que Sarlat possua algum grande monumento imperdível – caso de uma Torre Eiffel de Paris – mas o conjunto da obra é o que faz a visita valer a pena: as ruelas emaranhadas, as passagens, as fontes e praças, os telhados em pedra, enfim, a sensação de se passear em um museu a céu aberto.
Ensopados, mas satisfeitos, era hora de pensarmos no retorno. Descobrimos um mercadinho aberto, e compramos provisões para o nosso lanche/janta no trem. Por falar em refeições e ensopados, podemos voltar à receita que iniciou esse blog e que, a essa altura, já deve estar no ponto. Não sei quanto a vocês, mas toda essa história me abriu o apetite. Bon appétit e até a próxima! 😊
Obs: aos que tiverem interesse em conhecer um pouco mais da região de Sarlat e arredores, recomendo uma olhada nos seguintes sites:
- Office de Tourisme de Sarlat (FR/EN/ES): http://www.sarlat-tourisme.com/
- Site com informações da cidade e arredores (EN): http://www.northofthedordogne.com/sarlat.php
- Informações turísticas da Dordogne (FR/EN/ES): http://www.dordogne-perigord-tourisme.fr/
- Sugestão de roteiro no vale do Dordogne próximo a Sarlat (FR): http://www.linternaute.com/voyage/france/aquitaine/vallee-de-la-dordogne/circuit-vallee-de-la-dordogne/
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